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terça-feira, abril 19, 2005

O Bom Papa

Deixai-me lá escrever algumas palavrinhas sobre o papa que marcou o último quartel do séc. passado.

A imagem que guardo dele é a de um homem totalmente devoto daquilo em que acreditava. O que, por si só, vale pouco. Senão vejamos:

Foi fanaticamente contra o planeamento familiar e portanto travou uma cruzada contra o preservativo. O que o torna (a ele e à igreja) directamente responsável pelo alastrar do vírus HIV/SIDA em África ou em países, como as Filipinas, profundamente católicos onde a pandemia mata e corrói as estruturas sociais das comunidades. Exemplo disto são os cerca de 38 Milhões de pessoas infectadas em todo mundo, sendo que, das quais, 25 milhões são de África, 15 milhões são mulheres, e dois milhões são crianças. Em resultado desta pandemia há 9 milhões de novos órfãos por todo o mundo. Ver dados aqui .

Cabe, portanto, há igreja e a este papa em particular uma fatia bem larga da miséria social e humana que a SIDA atira às pessoas por este mundo fora, impedindo-as, a pretexto de uma qualquer salvação divina, de se salvarem por elas próprias.

Por outro lado, dizer que foi JP2 o responsável pela queda do comunismo, como agora os mais fieis comentadores dizem, é tão e só um disparate completo. A URSS podia bem com ele e com a igreja, embora fosse sempre um poder incómodo. Não pôde foi, consigo mesmo nem com o mundo que a rodeava, nem com pessoas como Lech Walesa, Vaclav Havel, Gorbachov, ou aqueles milhares anónimos que fizeram a primavera de Praga. Ou simplificando, não teve a capacidade de adaptação que o capitalismo teve.
Ou foi a primavera de Praga, a crise económica da URSS, a derrota no Afeganistão, o desastre de Chernobil, a Glasnost, ou a Perestroika, responsabilidades do papa?

Por outro lado a posição favorável à libertação de Pinochet quando este foi detido em Londres revela bem o carácter libertário e democrático deste papa.
Ou por exemplo a beatificação de admiradores de regimes ditatoriais ou fascistas. Só para dar o exemplo: o cardeal Shuster apoiante de Mossulini ou Balaguer, fundador da Opus Dei e admirador de Franco.

Quanto ao papel da mulheres na igreja e fora dela, acho que estamos conversados acerca do que pensava.
A sua posição sobre o aborto, a eutanásia ou a homossexualdade é (foi) tão fundamentalista como a sua posição sobre o preservativo, tendo mesmo feito ingerências nas políticas internas dos Estados a fim de conservar o estado medieval das leis e opondo-se é sua alteração (Portugal é um caso exemplar). E é claro meus amigos, tudo em prol da liberdade e do respeito pelas opções de cada um.
Mas por outro lado, prolongar a vida do sumo pontífice com um tubinho para ele comer (ou respirar, já nem sei!) já não há problema. Já é conforme a vontade de Deus. (Aí está a hipocrisia de que se falava.)

Foi apesar disto tudo o papa que contribuiu para o diálogo inter-religioso aproximando assim as várias religiões com a religião católica, embora ainda assim muitos digam que o seu ecumenismo tenha sido mais hegemónico de que fraterno.
E, também, honra lhe seja feita quanto à guerra do Iraque. Se bem que o raspanete (a quem a fez) podia ser outro.

Bem. A lista de exemplos do papa “que não tinha defeitos e era só bondade” podia continuar, mas como já vai longo o texto resolvemos ficar por aqui. Já é suficiente para me opor à vassalagem prestada no espectáculo obsceno que foram as suas cerimónias fúnebres que, vendo bem as coisas, mais não foram do que o culto da personalidade travestido de manifestação de fé.


2 Comments:

Blogger sguna diz...

Agoram digam que na mediatização da sua morte, mais aquela gente toda falou, a fazer do homem santo não houve a hipocrisia e cinismo do costume!

5:21 da tarde

 
Blogger sguna diz...

Bem vindo de volta, ó NC. Foi preciso a menina Cláudia pedir!!!

5:22 da tarde

 

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